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Publicado em 06/12/2021

João Pedro Neri Rozalem

Rivais sim, inimigos quase sempre

Se clássico virou sinônimo de guerra, como vencer de maneira "pacífica"?

O Futebol é conhecido mundialmente como um esporte capaz despertar os mais fortes e genuínos sentimentos de um ser humano. Alegria, tristeza, saudade, ansiedade, e, talvez, aquela que seja a expressão mais pura e sincera da exaltação, a raiva. 

 

Desde pequenos vimos ou fomos ensinados por alguém a ter algum clube para torcer, mesmo sem saber ainda as regras básicas de uma partida. A cultura do futebol sempre esteve presente de alguma forma nos lares brasileiros, e, por consequência, um pouco mais tarde, também nos foi ensinado que deveríamos além de amar, também odiar um clube adversário, torcer pelo seu fracasso, ter raiva.

 

As grandes rivalidades no futebol se intensificaram quando quebraram a sua própria bolha esportiva e começaram a agregar aspectos sociais, raciais e políticos em seus confrontos. Aspectos esses, que vieram, muitas vezes, de posicionamentos vindos da arquibancada. Estes ajudavam a inflamar ainda mais partidas que já eram acirradas, e, por característica, violentas. 

 

Essa violência não se limita somente a física, mas também se propaga como um sentimento irracional de não aceitação do outro, o que leva os torcedores a aderirem ao ponto de vista “rivais sim, inimigos também”.

 

Ao redor do mundo não faltam exemplos que nos fazem entender melhor como esse sentimento de rivalidade transborda as quatro linhas. Na Escócia, temos o Celtic, clube formado por trabalhadores descendentes de irlandeses e símbolo da luta imigrante no país, e o Rangers, time criado pela alta elite escocesa e usado como bandeira do patriotismo Britânico.

 

 

 

 

 

 

 

A rivalidade entre os dois clubes, além ter raízes em uma disputa de religiões, também se ampara em divergências políticas, já que a maioria da torcida do Celtic é apoiadora da independência da Escócia em relação ao Reino Unido, já pelo lado dos Rangers, eles se identificam como “Anglicanos, britânicos e fiéis à coroa”, favoráveis à continuação do país como parte do Reino Unido.

 

Ambos os clubes, por muito tempo, se orgulhavam de não terem jogadores de outras religiões, a não ser a religião predominante de cada um. Ao fugir deste padrão, ocorreram casos notórios como quando um jogador católico foi contratado pelo Rangers e logo foi ameaçado de morte, tendo que se mudar para outra cidade. Outro exemplo foi o episódio em que o goleiro do Celtic fez o símbolo da cruz durante um clássico na casa dos Rangers e foi perseguido e espancado pela torcida protestante.

 

No futebol nacional, tivemos, recentemente, o caso do garoto Bruninho, torcedor mirim do Santos. O garoto de nove anos foi hostilizado por torcedores em plena Vila Belmiro após pedir a camisa do goleiro Weverton na partida contra o Palmeiras, caso esse que gerou revolta nas redes sociais e levantou grandes questões para os aficionados pelo esporte: Qual o limite da rivalidade? Quando uma partida deixa de ser uma disputa e se torna uma guerra?


 

De acordo com Gabriel Faustino (19), torcedor do Santos, um clássico vai muito além do que é praticado dentro de campo: “Quando tem um Santos e São Paulo, Santos e Corinthians, é uma clima diferente no estádio, quando ainda tinha torcida visitante, o pessoal gostava muito mais de xingar e zoar eles do que ver o jogo em si”.

 Gabriel reconhece que a vitória num clássico é uma das melhores sensações do futebol, mas que muitas pessoas iam para o estádio com outras intenções: “O Santos sempre foi o time mais excluído de São Paulo, nosso jogos não passam em canal aberto e muito menos tem programas comentando, então as torcidas organizadas tinham que arrumar alguma maneira de aparecer, e, muitas vezes, era arrumando alguma confusão ou partindo pra briga com alguma torcida rival”.

Mesmo com uma cultura violenta tão enraizada no futebol, ainda existem maneiras de tornar esse ambiente de jogo mais saudável. Voltando a Escócia, a principal rivalidade do país percebeu que convivendo de maneira brutal, incidentes graves poderiam acontecer e gerar consequências piores, assim, o Celtic e Rangers iniciaram um movimento de mudança por onde ainda é possível enxergar esperança para o futuro, a juventude. 

 

Os times criaram o “Old Firm Alliance”, programa social voltado para educar crianças e jovens contra o sectarismo presente na atmosfera da partida, para que, dessa forma, haja a prospecção do respeito e aceitação que se deve ter independente de escolhas políticas, religiosas, e, principalmente, esportivas.

 

Para lidar com torcedores que só pensam em seu clube, nada melhor que a própria instituição tomar partido e promover ações com objetivo de combater a violência praticada nas arquibancadas e fora delas, ensinando o seu torcedor que um clássico deve sim ser jogado com raça e vontade, porém que pare por aí, no limite saudável, sem ataques, sem violência, sem espaço para selvageria, deixando esse forte sentimento somente dentro de campo e sobrelevando a bandeira daquela famosa frase: “Rivais sim, inimigos nunca”.

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Torcedores do Celtic e Rangers em clássico disputado pelo campeonato escocês

Foto/Yahoo

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Torcida Jovem, principal torcida organizada do Santos

Foto/ Lance!

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